Eu sempre fui bem cagona. Montanha russa, piruetas, multidões, nunca foram meu forte. Eu preferia violão, cerveja, bons amigos, relações irritantemente cúmplices. Eu sempre precisei pisar em chão firme para achar que assim, eu estava segura na minha medíocre existência e podia, enfim, respirar sem medo de ser devorada pelos perigos.
Mas com as coisas da vida eu sempre me joguei, me atirei como um dardo em direção ao alvo. E voei leve feito o vento cada vez que tinha certeza que tinha entendido o manual da vida. E aí a vida reescrevia o tal do manual e eu me jogava de mais alto ainda. Voar leve sempre foi um sonho.
Eu me atrevia em paixões proibidas, eu amava quem eu não podia amar, quem não me amava e quem nunca nem ia saber quem eu era. Eu chorava litros e litros com dores de cotovelo que pareciam mortais, letais, definitivas como quase tudo na minha vida. Eu perdoava quem merecia ir pro inferno de queda livre e sem direito a um telefonema sequer. E eu também vivia histórias inacreditáveis porque eu sempre quis abraçar todas as possibilidades que a vida achou que tinha que me dar. Ou todos os castigos que, depois do meu julgamento, ela achou que eu tinha que levar. Eu me atropelei N vezes, eu me venci e fui vice na mesma disputa. Eu passei a vida lutando contra mim mesma. Era preciso ser normal, saber obedecer leis e entender as regras. Dizia e diz a sociedade, o mundo e os casamentos bem sucedidos.
Eu ri alto, eu dancei, eu passei de antipática. Eu cantei errado, tomei todas, pileques históricos, eu fiz xixi na Cidade Jardim em pé porque não dava para chegar em casa. Eu fingi sim, eu rezei ajoelhada quando não queria que o mundo risse dos meus medos idiotas, eu fui a outra. E fui feliz sendo a outra.
Eu quis tudo interminavelmente, eu me arrependi de ter essa mania de achar que só vale eternizando, eu fui várias vezes em terreiros para ver se algum Santo aliviava aquela porra toda que era sofrer até terminar raquítica. Várias vezes eu entrei em hospitais, com medo de estar enfartando de verdade, na prática. E os médicos davam o diagnóstico: crise de ansiedade. Das fortes. Enfartar de tanto viver, do coração explodir de amor, de paixão, de sangue quente na veia, de tesão numa alma tarada e sem vergonha alguma.
Eu nunca achei que eu tinha a vida inteira pela frente. Então fui engolindo com farofa e engasgando, até que aprendi a cuspir. Cada encontro chato, cada segundo desperdiçado, cada trecho de música, cada merda que meu cérebro inventava para a vida ficar mais florida. Eu engoli para fingir com mais convicção que eu era uma menina normal. Que tinha os mesmo sonhos e vontades das meninas normais.
Mas na verdade tudo que eu queria era poder ser anormal, desejar voar leve e viver torto.
Viver torto até o dia de morrer reta.
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